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The Mist

Ano: 2007

Realizador: Frank Darabont

Actores principais: Thomas Jane, Marcia Gay Harden, Laurie Holden

Duração: 126 min

Crítica: Hoje em dia, Frank Darabont encontrou toda uma nova legião de fãs. Depois de praticamente ter ficado queimado na sétima arte, e após alguns anos de ausência, Darabont concebeu e desenvolveu a série ‘Walking Dead’ a partir de 2010, e agora, na onda do sucesso desta, a série ‘Mob City’. Com este inusitado sucesso parece difícil que Darabont regresse ao cinema nos próximos tempos, como realizador ou argumentista, o que é de lamentar visto que foi um dos grandes autores a surgir na década de 1990. Argumentista de trabalhos para a TV produzidos por Spielberg como ‘As Aventuras do Jovem Indiana Jones’ e outros filmes menores de fantástico/terror, Darabont deu o salto para realizador com duas obras primas, ambas baseadas em trabalhos do escritor Stephen King, seu amigo. ‘The Shawshank Redemption’ (1994), a sua estreia, é simplesmente um dos melhores filmes alguma vez feitos, e ‘The Green Mile’ (1999) é também uma obra poderosa e impactante, sem contudo ter a perfeição de Shawshank. Ao terceiro filme, ‘The Majestic’ (2001) a sua popularidade critica e comercial começou a decrescer. Era mais um filme de longíssima duração, um épico emocional, que ainda por cima contava com Jim Carrey num papel não cómico, o que nada agradou ao público e aos críticos. Para mim contudo, ‘The Majestic’ é mais um grande filme (não nos podemos cegar pelo facto de Carrey estar a tentar desesperadamente ser dramático), por isso passei a ter Darabont na minha carteira de realizadores imperdíveis.

Contudo, até hoje, Darabont fez apenas mais um filme. Tal como outro magnífico realizador dos anos 1990, Martin Brest (que após brilhantes trabalhos em ‘Scent of a Woman’, 1992, e ‘Meet Joe Black’, 1998, não voltou a fazer um filme após o fiasco de ‘Gigli’, 2003), Darabont, que já tinha ficado de pé atrás com a indústria após ‘The Majestic’, arruinou completamente a sua carreira com ‘The Mist’. Desde o momento em que foi lançado no cinema, ‘The Mist’ foi completamente trocidado pelos críticos e rapidamente ganhou a reputação de filme péssimo com um dos finais mais estúpidos da história do cinema. Por essa razão, muito embora o meu amor pelo trabalho anterior de Darabont fosse grande, fiquei reticente em ir ver este filme ao cinema. À medida que foi atacado, depois esquecido, e Darabont desapareceu de cena, o meu interesse pelo filme decresceu, e passaram-se uns três ou quatro anos até que finalmente ganhei coragem para o ver em casa. Tinha que o fazer, a minha paixão pelos filmes anteriores de Darabont assim o exigia, mas tinha um pressentimento que desta vez os críticos estariam correctos. E isso era bem verdade. Quando acabei de o ver, naquele dia em Abril de 2010, as minhas notas que revejo agora são mais que conclusivas: sim, é um filme péssimo (não que seja assim tão mau em termos de técnica cinematográfica, é simplesmente completamente idiótico em termos de conceito) e sim, tem definitivamente o final mais estúpido da história do cinema. 

Vamos por partes. Mais uma vez, ‘The Mist’ é baseado num livro de Stephen King. Eu nunca li este livro, mas deduzo que tenha muitas descrições que não são apreendidas da mesma maneira por quaisquer dois leitores diferentes. Ou seja, deve ser um daqueles livros cuja tensão e o horror provêm da imaginação do leitor, ao conceber na sua cabeça os cenários, porque o livro, obviamente, nega essa imagem visual. Ora o cinema dá essa imagem, por isso é que eu defendo que nem todos os livros podem ser adaptados a filme. Há filmes em que essa criação do visual estraga completamente a obra, ou melhor, faz com que ela não resulte, porque é preciso materializar qualquer coisa, e aquela magia da incerteza que é exacerbada pela imaginação perde-se. Este é, mais do que certo, o caso de ‘The Mist’. Quando a história é transposta para imagens, torna-se, muito simplesmente, completamente estúpida.

Imagine o leitor a típica cidade média Americana, que se distingue das outras por ter perto uma base militar e por isso ter muitos militares a andarem de um lado para o outro. É um dia típico, como qualquer outro, e as personagens andam pela cidade nos seus afazeres normais. Mas de um momento para o outro levanta-se um estranho nevoeiro, que se vai adensando, adensando e cobrindo toda a cidade. O nevoeiro parece esconder qualquer coisa, pois tudo o que entra em contacto com ele é destruído. Árvores são arrancadas, carros são levantados no ar, pessoas são feridas ou mortas e o caos prolifera. Dentro de um supermercado, onde a acção e a câmara se condensam, as pessoas que tiveram a sorte de lá estar ou de lá conseguir entrar, incluindo o nosso herói (Thomas Jane), barricam-se contra a estranha ameaça. Quem tenta sair do supermercado é morto mal mete um pé de fora, portanto gera-se aqui, aos olhos do espectador, um núcleo fechado, um micro-cosmos daquilo que poderá estar a acontecer por toda a cidade, ou todo o mundo. Não sabemos. A partir deste momento só a perspetiva do supermercado é real para o filme.

Iniciam-se então óbvios momentos de tensão, em que os ocupantes do supermercado aguardam impacientes e depois, de uma forma clássica, discutem e discutem sobre aquilo que devem fazer. De quando em quando as portas e janelas são atacadas e aos poucos o filme revela os seus vilões, uns extra-terrestres gigantescos e com a forma de insectos, ao mais belo estilo Alien ou Starship Troopers. Estes bicharocos possuem uma força gigantesca e disparam ácido. Contudo (a primeira coisa realmente estúpida do filme), apesar de conseguirem despedaçar um ser humano em dois sem qualquer esforço, apesar de destruírem carros e portas e janelas com ácido, e apesar de matarem toda a gente que mete um nariz fora do supermercado, parecem ter uma enorme dificuldade em invadir o supermercado. Só o tentam uma e única vez, ainda por cima sob a forma de uns bicharocos muito pequeninos que tentam infiltrar-se e que são mortos pelos nossos heróis após uma batalha heróica. Mas então e os bicharocos grandalhões? Não conseguiriam eles muito facilmente arrancar a porta do supermercado e disparar ácido lá para dentro à bruta? Se é para matarem humanos porque é que não destroem simplesmente o supermercado? Arrancam o telhado ou partem os vidros ou abalroam as paredes? Estão a torturar psicologicamente os humanos? Não se percebe.

E por os bicharocos terem esta atitude incompreensível, isso permite que um drama se desenrole neste microcosmos. Obviamente, em número reduzido e confinados num espaço fechado com comida limitada, há sempre umas pessoas que começam a ficar um bocado paranóicas e começam a dividir-se em facções, como não podia deixar de ser. Isto poderia ser uma muito boa alegoria da guerra, da geo-política, etc, etc, mas não é. De todas as possibilidades possíveis e imaginárias que o filme poderia explorar, de todos os conflitos que se poderiam desenrolar dentro do supermercado, só a vertente do fanatismo religioso é que é explorada. Marcia Gay Harden interpreta uma senhora que começa a profetizar o apocalipse, a convencer os outros que os bicharocos são enviados por Deus para expurgar a Terra e que devem haver sacrifícios humanos para “os apaziguar”. E a verdade é que esta lengalenga convence metade dos ocupantes do supermercado! De um lado temos então estes fanáticos que ficam insanos e que tentam matar os outros para os sacrificar aos bicharocos, e do outro os 'normais', onde está o nosso herói, que apenas tentam encontrar uma forma de sair do supermercado. Visto que quem sai do supermercado é morto, não sei bem qual é a pressa deles de sair para o exterior. Aparentemente, entre os bicharocos e os humanos ensandecidos, eles preferem os bicharocos… Há uma lição de vida aqui algures…

Isto arrasta-se ao longo de uma hora, com várias mortes de permeio (quer pelos extra-terrestres quer pelas lutas dentro do supermercado). Entretanto um soldado que está dentro do supermercado lá explica mais ou menos de onde é que os bicharocos vieram e o que é que desejam (sem que seja uma revelação assim tão interessante). E então (aleluia!) o grupo dos ‘normais’ decide arriscar e sair do supermercado. Onde todas as pessoas antes foram mortas mal puseram um pé de fora, os nossos heróis vão como se nada fosse (apenas com a habitual morte de um elemento do grupo para o dramatismo) até ao parque de estacionamento, entram num carro e simplesmente arrancam dali para fora. Magnífico. Guiando como se estivessem a fazer um passeio turístico, eles vêm como é que o mundo está mudado, o que é que os bicharocos andaram a fazer e a destruir, mas estranhamente, nenhum destes extra-terrestres ataca o carro. Perseguiram-nos até ao parque de estacionamento, mas uma vez dentro do carro nunca mais os incomodaram. Magnífico. Podem disparar ácido e arrancar as pernas de um homem como se fosse manteiga, mas não conseguem penetrar nem em supermercados nem em carros. São muito foleiros estes bicharocos.

E então os nossos heróis guiam e guiam, perdidos no meio do nevoeiro. Depois, ficam sem gasolina... e um deles tem um revolver… Faltam 5 minutos para acabar o filme...

Não é normal resumir assim a história com tanto detalhe mas neste caso achei que precisava de o fazer para mostrar ao leitor o quão ridículo é todo o conceito do filme. Sem estragar o filme, não posso contar mais nada, mas só resta dizer que o que acontece nos últimos 5 minutos é incrivelmente ridículo e não tem grande lógica uma vez analisado. Qual é a mensagem que querem passar? Uma de patetice e insanidade? Qual é a moral? Não se entende. Por outro lado, também não quero despertar a curiosidade do leitor, pois eu não quero que veja o filme. Não merece mesmo a pena. Verdade que em termos de realização, actuação, fotografia, efeitos especiais e aí por diante, não há grande coisa a apontar, são agradáveis e não interferem. Os diálogos também não são maus, um pouco clichezados mas bem trabalhados. Mas quem é que está a notar nestes aspectos técnicos e artísticos com um conceito tão estúpido? E aquele final? Meu Deus. Não faço ideia o que é que Darabont estava a pensar. Ok, se reflectir um pouco sei que consigo extrair daqui um significado minimamente digno, mas isso não implica que esse significado seja lógico. Não o é. E a mensagem que esse significado tenta dar ao público também não. Para além do mais, o espectador estará demasiado preocupado em rir-se da estupidez daquilo que está a ver para reflectir sobre estas questões.

Eu disse estúpido muitas vezes nesta crítica, e sei perfeitamente que os filmes de terror/fantástico muitas vezes tomam um conjunto de liberdades que por vezes funcionam, não no contexto da realidade, mas no contexto dos universos alternativos que retratam, e por isso mesmo não podem ser interpretados da mesma forma que se interpreta um drama. Mas mesmo assim, mesmo tendo em contra essas considerações, ‘The Mist’ não é um filme credível nem cativante nem inteligente nem de entretenimento. É simplesmente o explorar de uma boa ideia por um caminho errado com uma conclusão plena de boas intenções mas que simplesmente não resulta.

Destruir a carreira cinematográfica de Drabont com os ataques a ‘The Mist’ não foi a coisa mais inteligente que a indústria cinematográfica fez nos últimos tempos. Felizmente, Darabont voltou para o seu meio predilecto e, com o grande período de popularidade que o formato ‘série’ vive neste momento, desde o virar do século XXI, encontrou o lugar de destaque que merece. Qualquer pessoa tem direito a fazer um filme mau, especialmente desta maneira. Darabont adaptou mais um livro do seu amigo, como fizera anteriormente com enorme sucesso com ‘Shawshank Redemption’ e ‘The Green Mile’. Mas desta vez cometeu um grande erro. Leio agora na internet que o final do livro é bem diferente. A escolha do filme estragou tudo, e abriu os olhos para a incoerência que todo o filme tem, e que a tem por o visual ser obrigado a mostrar coisas que de outro modo estariam ao encargo da imaginação. Darabont está, a meu ver, mais do que pronto para fazer um 5º filme, com toda a glória dos 3 anteriores. Como as coisas estão, infelizmente, Darabont deixa suspensa uma carreira no seu ponto mais baixo, tal como Brest deixou com ‘Gigli’. Mas estou convencido que o sucesso de ‘Walking Dead’ voltará a abrir portas a Darabont e, se ele quiser, terá de novo todas as possibilidades de se redimir e mostrar ao mundo que o seu sucesso cinematográfico nos anos 1990 não foi apenas fruto do acaso. E aí, ‘The Mist’ será apenas estatística, como o são filmes maus de grandes realizadores como por exemplo dois já criticados nestas páginas: ‘1941’ de Spielberg (crítica aqui) ou ‘Der Tiger von Eschnapur / Das indische Grabmal ‘ de Fritz Lang (crítica aqui).

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Miguel. Portuense. Nasceu quando era novo e isso só lhe fez bem aos ossos. Agora, com 31 anos, ainda está para as curvas. O primeiro filme que viu no cinema foi A Pequena Sereia, quando tinha 5 anos, o que explica muita coisa. Desde aí, olhou sempre para trás e a história do cinema tornou-se a sua história. Pode ser que um dia consiga fazer disto vida, mas até lá, está aqui para se divertir, e partilhar com o insuspeito leitor aquilo que sente e é, quando vê Cinema.

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