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Baby Driver

Ano: 2017

Realizador: Edgar Wright

Actores principais:  Ansel Elgort, Kevin Spacey, Jon Hamm

Duração: 112 min

Crítica: Esta semana fiz algo que já não fazia talvez há uns bons dois anos. Fui ao cinema depois de na semana passada ter também ido ao cinema ver ‘Dunkirk’. Ir ao cinema em duas semanas seguidas é um privilégio raro para um jovem pai (como o leitor que acompanha estas páginas sabe tornei-me muito mais um cinéfilo “casívoro”) mas felizmente tal se proporcionou nesta primeira semana do nosso querido mês de Agosto.

Mas agora que eu e a minha esposa tínhamos umas horas livres, a grande questão que se colocava era o que ir ver. Agosto é uma época algo morta do cinema. As grandes estreias do Verão já estiveram nas salas em Junho e Julho e como hoje em dia os filmes ficam apenas duas ou três semanas nas salas de cinema (uma vergonha!) alguns dos filmes que queríamos ver já tinham saído de exibição. Basicamente, e tendo em conta a nossa janela de tempo, a escolha ficou entre ‘Baywatch’ e ‘Baby Driver’. Ainda estivemos tentados em ir ver ‘Baywatch’ só para relaxar, mas ambos sabíamos o que provavelmente ia sair dali: um monte de piadas ocas e ordinárias num filme que no dia seguinte já seria uma memória distante. Por isso apostamos em ‘Baby Driver’ (em português 'Baby Driver - Alta Velocidade') o novo filme de Edgar Wright. Bem… confesso que no final fiquei a pensar se não teria ficado mais bem servido com ‘Baywatch’

"O filme herda claramente dos dois grandes filmes americanos sobre condutores de carros de fuga: ‘The Driver’ (1978) (...), e a sua re-imaginação de 2011 ‘Drive’ (...) mas substitui a profundidade dos temas que estas obras contêm por uma estética de videoclip e uma superficialidade emocional assente no jovem herói, reflexo da Geração Z, que hoje é parte integrante do blockbuster americano"

Gostei, ou talvez a melhor palavra seja "desfrutei", de todos os filmes de Edgar Wright até este ponto. O inglês que limou a sua arte na televisão durante a década de 1990 explodiu na cena cinematográfica com a chamada trilogia do Cornetto, a trilogia que tornou famosa a dupla cómica composta por Simon Pegg e Nick Frost. Com o magnífico ‘Shaun of the Dead’ (2004), o hilariante ‘Hot Fuzz’ (2007) e ‘The World's End’ (2013), Wright tornou-se uma espécie de Mel Brooks do humor inglês, ou seja, produziu comédias tecnicamente bem executadas enraizadas num profundo, mas respeitoso, conhecimento da história do cinema nos vários géneros que parodiava. Pelo meio fez também o sucesso ‘Scott Pilgrim vs. the World’ (2010), adaptando a banda desenhada de culto com um misto de nostalgia dramática e magia amorosa.

Devido a este historial, o seu novo filme ‘Baby Driver’ pareceu desde o primeiro trailer completamente fora de carácter. Isto não era necessariamente um problema porque um bom realizador/argumentista (Edgar Wright escreveu sozinho o argumento) pode perfeitamente ser versátil em vários géneros. Mas eu estava algo desconfiado em relação a este filme, que foi objecto de um massivo marketing orientado para um público jovem, devido à enorme familiaridade temática, pelo menos para mim, do material. Os dois ou três trailers de ‘Baby Driver’ que foram saindo ao longo dos últimos seis meses não deixavam muito para a imaginação. O filme parecia herdar claramente dos dois grandes filmes americanos sobre condutores de carros de fuga: ‘The Driver’ (1978) realizado por Walter Hill (que, nem de propósito, tem um pequeno cameo neste filme), e a sua re-imaginação de 2011 ‘Drive’ de Nicolas Winding Refn; mas com a habitual diferença que caracteriza o cinema pós-moderno. O seu herói é um jovem-adulto que consegue fazer tudo sem uma pinga de dificuldade. Às vezes detesto ter razão e este é um destes casos.

De facto, ‘Baby Driver’ é precisamente isso; um remake destas grandes obras do passado, mas que substitui a profundidade dos temas que estas obras contêm por uma estética de videoclip e uma superficialidade emocional assente neste herói jovem que hoje é parte integrante do blockbuster americano. Este é o herói que habita filmes como ‘Harry Potter’, ‘Maze Runner’, ‘Hunger Games’, ‘Divergent’ ou o recentemente estreado ‘Valerian’. É o herói cujos poderes são sempre inatos (não teve de se esforçar para os conseguir), que consegue tudo o que quer, e que não tem ambiguidade porque os filmes o defendem sempre. Um reflexo perfeito da geração ‘millenial’, ou da Geração Z que cresceu sem filtros e a acreditar no sucesso fácil. E é por isso também que o filme falha, ou pelo menos o motivo pelo qual eu não me consegui identificar com ele. A magnífica estética das obras anteriores de Wright, a paródia sentida e respeitosa, é uma memória distante, substituída pela estética oca em que o “parecer bem” é o que mais importa. O filme referencia o look destas e de muitas outras obras (o universo de Michael Mann, das obras-primas ‘Thief’, 1981 a ‘Heat’, 1995, também é perceptível), mas nunca a sua substância.

"Todo o filme é uma grande playlist de músicas pop-rock do último meio século (...) A música inunda a banda sonora, abafando os diálogos mas também as emoções já que cria ambientes estilizados que são também fortemente artificiais. Pior é a incapacidade do filme conseguir seguir a coreografia imposta pela música. Inúmeras vezes a música está fora de tom com a montagem das cenas, principalmente quando é Baby que tem de sustentar essa energia."

Depois de Ryan O’Neil em ‘The Driver’ e de Ryan Gosling em ‘Drive’, o condutor é agora Ansel Elgort, um jovem actor que alcançou a fama precisamente na saga ‘Divergent’. Elgort, cuja personagem se auto-intitula de Baby (só porque sim), até tem a introspecção, ou pelo menos a semi-timidez e a capacidade de ter alguma presença sem falar muito, que se pede à típica personagem solitária com um passado escondido. Mas não tem, definitivamente, a força interior para tornar a sua personagem mítica ou cativante. As primeiras cenas estão cuidadosamente trabalhadas para provar duas coisas. A primeira é a sua brilhante, mas inexplicável capacidade de condução, reflectida, tal como nos inícios de ‘The Driver’‘Drive’ por uma fuga bem sucedida após um assalto. Baby demonstra toda a sua incrível técnica atrás ao volante, exacerbada por algumas stunts muito bem obtidas (não há cá efeitos especiais), muito embora, pessoalmente, tenha achado bastante enervante os inúmeros planos dele a levantar o travão de mão quando faz piões ou curvas apertadas (são para aí uns dez em menos de um minuto, e não há um único plano dele a baixar o travão!). 

A segunda é a tentativa quase desesperada de tornar Baby uma personagem universal e com quem o público possa simpatizar. Baby participa como condutor de carros de fuga em assaltos, mas ele próprio nunca assalta nem faz nada de violento. Apenas conduz. E fá-lo, como descobrimos um pouco mais tarde, porque é órfão e está a pagar uma dívida a um grande mafioso chamado Doc (uma das muitas referências a ‘Back to the Future’) interpretado, em piloto automático, por Kevin Spacey (mas Spacey em piloto automático é extremamente cool na mesma…). O filme defende Baby desde o início e mesmo quando as circunstâncias o obrigam à violência, esta é sempre orientada contra quem supostamente o merece, desde ladrões, mafiosos ou até dois jovens afro-americanos insuspeitos que estão a fumar umas ganzas no seu carro ‘quitado’…

Pelo contrário, Baby nunca trata mal quem não merece. Quando rouba um carro a uma velhota, é respeitoso, pede-lhe desculpa e até volta para trás para lhe dar a carteira. E o filme tem ainda mais um elemento extremamente forçado para nos obrigar a sentir simpatia por ele se tudo o resto falhar; o seu padrasto é um senhor afro-americano mudo, preso a uma cadeira de rodas, de quem Baby cuida com afecto. Mas é através da sua grande paixão pela música que o argumento procura fazer a ponte com os espectadores jovens, público-alvo por excelência de ‘Baby Driver’. Desde o genérico de abertura com a música “Harlem Shuffle” de Bob & Earl, que parece imitar o de ‘Guardians of the Galaxy’ (2014), todo o filme é uma grande playlist de músicas pop-rock do último meio século, até o clássico de Simon e Garfunkel “Baby Driver” tocar previsivelmente no genérico final. Estas músicas marcam, a la videoclip, a cadência da maior parte das cenas mas, tal como o resto, parecem não funcionar devidamente, ou pelo menos como era suposto, à medida que o filme se desenrola.

"Em ‘The Driver’ vemos na cara de Ryan O’Neil o peso dos anos de experiência, tal como vemos no rosto de James Caan em ‘Thief’ (...) Aqui tudo o que vemos é um miúdo convencido. Aliás, tal é provado na cena em que repete todo o plano com ar presunçoso (...) Para o filme é uma cena cool para exibir a craveira de Baby. Para mim é uma cena que só intensifica a presunção de toda a sua geração. Não compro a personagem. De todo."

Comecemos pela música. Wright pretende pôr-nos na perspectiva sonora de Baby, que não vai a lado nenhum sem os seus múltiplos ipods. A música inunda a banda sonora (constantemente abafando os diálogos) mas abafa também as emoções já que cria recorrentemente ambientes estilizados que são também fortemente artificiais. Pior é a incapacidade do filme conseguir seguir a coreografia imposta pela música. Inúmeras vezes a música está fora de tom com a montagem das cenas, principalmente quando é Baby que tem de sustentar essa energia. Ansel Elgort não tem o ritmo natural de um Chris Pratt e isso nota-se. Aliás, comparar a dança de Pratt no genérico de ‘Guardians of the Galaxy’ com a dança de Elgort pela rua no genérico deste filme é como comparar o Fred Astair comigo. Sinceramente, a meio do filme comecei a pensar se a falta de ritmo de Elgort não seria propositada, para humanizar mais a sua personagem. Pode ser ou pode não ser. Mas se há miúdo que tenta desesperadamente sentir a música sem o conseguir, é este. E o espectador sente essa rigidez.

Depois não me identifiquei nada nada com a personagem de Baby. Com 32 anos de idade, já não sou um adolescente e já deixo de ser um jovem adulto, e como o leitor já percebeu não vou muito com a cara destes jovens heróis cinematográficos modernos porque sempre achei que estavam construídos com demasiada unidimensionalidade. Talvez a minha falta de conexão com Baby seja defeito meu. O filme quer que acreditemos na sua inocência e no seu bom coração, que faz o que faz pelo amor aos carros mas também porque não tem escolha. Mas sinceramente eu não consigo acreditar nisso pois foi ele que se pôs, conscientemente, nessa situação. O filme estabelece desde o início (portanto não estou a dar um spoiler) que Baby ficou órfão porque os seus pais faleceram num acidente de viação, o mesmo que o deixou com o problema no ouvido que o “obriga” a ouvir música constantemente para se concentrar. Ok, tudo bem. Mas depois há um salto inexplicável para o agora.

Tudo o que sabemos é o que Doc conta vagamente aos outros assaltantes. Baby começou a roubar carros aos 12 anos de idade para andar neles só pelo gozo de conduzir, abandonando-os pouco depois. Mas quem o ensinou a conduzir naquela idade? Não é explicado. E quem o ensinou a conduzir tão bem? O miúdo é tão sobredotado ao ponto de entrar num carro sozinho e saber logo todos os truques dos corredores de fórmula 1? Em ‘Drive’ o anti-herói é um duplo de cinema. Em ‘The Driver’ vemos na cara de Ryan O’Neil o peso dos anos de experiência, tal como vemos no rosto de James Caan em ‘Thief’, ou no rosto de qualquer outro anti-herói misterioso, como o homem sem nome de Clint Eastwood. Aqui tudo o que vemos é um miúdo convencido. Aliás, tal é provado na cena em que repete todo o plano com ar presunçoso só porque a personagem de Jamie Foxx, Bats, acha que ele não está a ouvir. Para o filme é uma cena cool para exibir a craveira de Baby. Para mim é uma cena que só intensifica a presunção de toda a sua geração. Não compro a personagem. De todo.

"Embora Lily James até convença como a desencantada mas terra-a-terra small town girl, é de notar que a sua química com Elgort é totalmente inexistente. A cena em que se encontram num diner e têm um pequeno flirt é das cenas mais mal escritas que eu já vi (...) Deborah não consegue funcionar como um objecto de pureza; o catalisador para tirar Baby da sua “vida do crime” como foi por exemplo a personagem de Tuesday Weld em ‘Thief’"

O argumento segue uma estrutura previsível. Baby integra uma equipa de ladrões que inclui o Bats de Foxx (o imprevisível ‘doido’ de serviço, mas que acaba por ser mais estiloso, num estilo mauzão, do que propriamente o ameaçador que deveria ser); Buddy (o ‘Mad Man’ Jon Hamm, preso a um papel algo rotineiro); e Darling (Eiza González, que está aqui para ser sexy… e é – recorda a energia de Megan Fox no primeiro ‘Transformers’). Ele é forçado a fazer os assaltos porque um dia roubou o carro de Doc que continha, sem ele saber, mercadoria valiosa que foi perdida quando Baby abandonou o carro depois da sua ‘diversão’. Mas quando a história do filme começa só está a um ou dois trabalhos de selar a sua dívida e espera depois disso abandonar esta vida (não esperam todos?!) e rumar para o desconhecido com a sua nova paixão, a empregada de mesa Deborah. Embora a ‘Cinderella’ Lily James até convença como a desencantada mas terra-a-terra small town girl, é de notar que a sua química com Elgort é totalmente inexistente. A cena em que se encontram num diner e têm um pequeno flirt é das cenas mais mal escritas que eu já vi e não destoaria nada numa daquelas ridículas comédias românticas em mosaico como ‘Valentine’s Day’ (2010). Estaria Wright a tentar escrever no cumprimento de onda dos jovens de hoje? É provável porque a sua ligação é primeiramente inspirada pelo aspecto físico (ficam pelo beicinho um do outro antes de trocarem uma palavra). E portanto, o seu amor é sempre demasiado conveniente e superficial. Deborah não consegue funcionar como um objecto de pureza; o catalisador para tirar Baby da sua “vida do crime” como foram por exemplo as personagens de Tuesday Weld em ‘Thief’ ou a de Carey Mulligan em ‘Drive’.

O grande ‘drama’ do filme é mais um lugar-comum. Obviamente, as coisas não vão ser assim tão fáceis como Baby espera. Como em ‘Thief’ e em milhares de outros filmes do género, o “inocente” não consegue abandonar a vida do crime porque os seus parceiros nunca o deixam partir. O código de honra entre assaltantes cessa quando começa o medo da denúncia por alguém que muda de lado. Vão chantageá-lo. Vão ameaçar magoar os seus entes queridos. Mas no proverbial one last job Baby, tal como outros anti-heróis antes dele, vai tomar o assunto nas próprias mãos. O último terço do filme junta os gritos de revolta de ‘Drive’ ou ‘Thief’ com os assaltos que dão para o torto de ‘Heat’ ou ‘Point Break’ e ainda tem uns cheirinhos da lenda de ‘Bonnie and Clyde’ (1967) ou 'Badlands' (1973) quando Baby e Deborah se tentam fazer à estrada, fugindo de tudo, sem planos. Conseguirão livrar-se das “más” amarras que os prendem ao passado? Conseguirão começar uma vida juntos? E conseguirá Baby fugir à justiça, pois apesar de todas as desculpas que o filme possa arranjar, ele é efectivamente culpado de crimes…?

Uma das coisas que mais me surpreendeu pela positiva foi precisamente a consciência que Wright acaba por ter deste último ponto. O filme defende sempre Baby mas no final não pode deixar de reconhecer que apesar de tudo ele é um criminoso. A personagem obviamente não terá o destino trágico de todos os heróis dos filmes que mencionei ao longo desta crítica (não poderia ter no enquadramento deste novo género de filmes centrados em jovens adultos), mas é bom para o filme ter um bocadinho desta consciência antes dos “inocentes” poderem prosseguir com as suas vidas. Outros pormenores agradáveis são claro as grandes sequências de acção com os automóveis (a melhor coisa que o filme tem), a banda sonora em si (apesar de como disse as cenas não conseguirem ser bem coreografadas ao sabor dela) e algumas boas interpretações (com a de Hamm e a de Spacey). Mas não encontrei grandes motivos de interesse no resto; nem no argumento, nem no drama humano.

"O filme defende sempre Baby mas no final não pode deixar de reconhecer que ele é um criminoso (...) É bom para o filme ter esta consciência (...) Outros pormenores agradáveis são as grandes sequências de acção com os automóveis (a melhor coisa que o filme tem), a banda sonora (...) e algumas boas interpretações (com a de Hamm e a de Spacey). Mas não encontrei grandes motivos de interesse no resto; nem no argumento, nem no drama humano."

No fundo, tudo se resume a dois pontos: originalidade e público-alvo. Para um conhecedor das grandes obras do cinema urbano e nocturno sobre assaltantes solitários; para o conhecedor de ‘Drive’, ‘The Driver’‘Thief’, ‘Heat’ e tantos outros que este filme vai referenciando (cito estes pois são os meus preferidos, principalmente ‘Thief’ que é um filme que amo profundamente), ‘Baby Driver’ é mera repetição que não oferece nada de novo, e o que oferece, em termos de estética fílmica e emotividade, é claramente inferior. Mas principalmente, depois de assistirmos a esta história centrada em homens marcados pelo tempos e pelo peso da experiência, é um gigantesco turn off ver a mesma coisa agora centrada num miúdo igualmente taciturno mas extremamente convencido cuja experiência não foi adquirida, é inata, cujo pathos é inexistente e que de repente, sem justificação, é exímio a fazer tudo (incluindo disparar armas). Um turn-off maior ainda é ver todas as personagens “más” a mudarem de carácter no último acto só para que Baby possa sair da situação com um brilharete, pelo menos na óptica do espectador. É uma clara manipulação do realizador, injustificada pela acção, só para que o herói fique bem na fotografia e seja redimido. De novo, não compro.

‘Baby Driver’ foi um filme barato (30 milhões de dólares) e que portanto já fez um lucro saudável com os 150 milhões que arrecadou até agora na bilheteira mundial. É merecido? Em parte. Suponho que no meio desta nova onda de heróis jovens-adultos até esteja aqui uma personagem relativamente interessante que apele às hordas de jovens espectadores que não têm conhecimento da história do cinema. A infusão de música dá classe ao filme e a estética de videoclip vai-se lentamente entranhando no espectador. Todo o filme está trabalhado para criar uma experiência visual e sonora (enfatizado pelo novo processo de reprodução de som Dolby Atmos) e podemos dizer que nesse sentido até é bem-sucedido. Mas quem tem um bocadinho mais de sensibilidade e conhecimento não pode fugir ao inegável. ‘Baby Driver’ não tem um argumento muito bem escrito. A sua história é previsível. A sua personagem principal é mais lugar-comum que memorável anti-herói. 

"Suponho que no meio desta nova onda de heróis jovens-adultos até esteja aqui uma personagem relativamente interessante (...) Mas quem tem um bocadinho mais de sensibilidade e conhecimento não pode fugir ao inegável. ‘Baby Driver’ não tem um argumento muito bem escrito (...) A sua personagem principal é mais lugar-comum que memorável anti-herói (...) e não consegue ter o poder suficiente para levar avante esta amálgama de referências visuais e sonoras."

‘Baby Driver’ é um exercício superficial, uma estética de fachada alimentada pelo gigantesco e inegável amor do seu realizador pela música e pelo cinema das últimas cinco décadas. Mas ao contrário dos anteriores filmes de Wright em que isto funcionava perfeitamente, porque a comédia era poderosa, ‘Baby Driver’ não funciona, talvez precisamente porque não é uma comédia. O misto de drama, romance e ‘heist-movie’ centrado num actor com pouca dimensão interpretativa, não consegue ter o poder suficiente para levar avante esta amálgama de referências visuais e sonoras. Resumindo, ‘Baby Driver’ é ‘The Driver’‘Drive’ e ‘Thief’ mas com um jovem-adulto ao volante e, como consequência, rege-se pelos referenciais e as morais da Geração Z. E é por isso que, apesar de muito prometer e da segurança com que Wright o filma, acaba por ser entretenimento oco e descartável. Se é isso que quer ver num filme, caro leitor, carregue no acelerador e siga. Eu por mim dispenso. Tenho ‘Drive’ e ‘Thief’ em blu-ray na estante aqui ao meu lado. Já estou bem servido.

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Miguel. Portuense. Nasceu quando era novo e isso só lhe fez bem aos ossos. Agora, com 31 anos, ainda está para as curvas. O primeiro filme que viu no cinema foi A Pequena Sereia, quando tinha 5 anos, o que explica muita coisa. Desde aí, olhou sempre para trás e a história do cinema tornou-se a sua história. Pode ser que um dia consiga fazer disto vida, mas até lá, está aqui para se divertir, e partilhar com o insuspeito leitor aquilo que sente e é, quando vê Cinema.

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