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Habemus Papam

Ano: 2011

Realizador: Nanni Moretti

Actores principais: Michel Piccoli, Nanni Moretti, Jerzy Stuhr

Duração: 102 min

Crítica: O último filme de Nanni Moretti poderá ser considerado, face aos desenvolvimentos actuais no Vaticano, quase como profético, mas na altura em que passou nos cinemas, em 2011, eu considerei-o, acima de tudo, hilariante. O problema é que eu estava perfeitamente ciente de que essa comicidade não era suposto existir. Ou melhor, é suposto o filme ter cenas hilariantes, mas não é suposto ser isso que o espectador se lembra quando sai da sala. Portanto, embora o filme possa ser classificado como ‘bom’ (pelo menos é melhor do que aquilo que nos chega da América recentemente) há um desequilíbrio em ‘Habemos Papam’. Moretti já nos habituou a filmes com declarações socio-políticas incisivas que contêm contrapontos cómicos, tais como ‘Il Caimano’ (2006) ou ‘Palombella Rossa’ (1989). Em ‘Habemos Papa’ esses dois níveis existem, mas em vez de se completarem, funcionam como extremos, nunca se tocam, e a pouco e pouco, a parte cómica toma conta do filme e o drama pessoal, o suposto cerne, é esquecido até quase deixar de ter importância.

O filme abre com a morte de um Papa. O conclave é convocado, e os cardiais fecham-se numa sala do Vaticano para escolher o seu sucessor. Logo à cabeça, há uma série de sequências cómicas que ocorrem durante a votação. Logo à cabeça, os líderes da religião católica são tratados não como tal, mas simplesmente como seres humanos.

"Moretti já nos habituou a filmes com declarações socio-políticas incisivas que contêm contrapontos cómicos (...) Em ‘Habemos Papa’ esses dois níveis existem, mas em vez de se completarem, funcionam como extremos, nunca se tocam, e a pouco e pouco, a parte cómica toma conta do filme e o drama pessoal, o suposto cerne, é esquecido até quase deixar de ter importância."

O grande Michel Piccoli, agora com 86 anos, prova que não perdeu nenhuma das suas qualidades. É eleito o novo Papa, mas segundos antes de ser anunciado aos milhares de fiéis que o aguardam na Praça de S. Pedro tem um ataque de pânico. Recusa-se a aceitar o cargo e fecha-se nos seus aposentos. Enquanto o povo aguarda, o assessor de imprensa do Vaticano chama Nanni Moretti, um psicanalista de renome. Quando não o pode ajudar (pois não há privacidade dentro do Vaticano) manda-o anonimamente à sua esposa, também psicanalista. É nessa viagem que o Papa foge, e tem uma espécie de ‘Férias em Roma’, em que tenta redescobrir uma liberdade que há anos não possui, e procurar forças para enfrentar o cargo que o aguarda.

Enquanto isso, os restantes cardeais não podem sair do Vaticano, pois tecnicamente o conclave ainda está convocado, visto o Papa ainda não ter sido anunciado ao Mundo. 'Preso’com eles está também Moretti, já que, devido ao acordo de confidencialidade por ter ouvido os devaneios do Papa, também é impedido de sair. As cenas do Papa a vaguear por Roma e a interagir com diversas personagens são intercaladas com as cenas dentro do Vaticano, em que os Cardeais e Moretti tentam arranjar formas de passar o tempo (incluindo um hilariante torneio de vólei), enquanto esperam que a polícia encontre o Papa e o traga de volta.

"As cenas dentro do Vaticano são hilariantes, mas apenas contribuem para a história como forma de mostrar o lado humano dos cardeais (...) Nada têm a ver com o caminho de redenção que o Papa está a ter pelas ruas de Roma (...) Por outro lado o drama do Papa está pouco desenvolvido"

É devido a esta estrutura bipartida que o filme se desequilibra. O Papa e o psicanalista apenas se encontram numa única cena. A partir daí os seus caminhos separam-se. As cenas dentro do Vaticano são hilariantes, mas apenas contribuem para a história como forma de mostrar o lado humano dos cardeais e a loucura de Moretti. Mas nada têm a ver com o caminho de redenção que o Papa está a ter pelas ruas de Roma. As duas histórias não estão relacionadas. Por outro lado o drama do Papa está pouco desenvolvido. Picolli dá uma expressividade dramática incrível ao papel, mesmo com poucas falas, mas as suas cenas diluem-se cada vez mais, à medida que são constantemente interrompidas pela comédia dentro do Vaticano. O clímax do filme, em vez de existir durante os eventos que levam o Papa a tomar a sua decisão final de retornar ao Vaticano e fazer as pazes consigo próprio, existe em vez disso durante o torneio de vólei, que toma completamente conta do filme. O escape cómico torna-se o elemento mais importante do filme, e salta à vista, como mencionei no início, que isso não era suposto.

Mesmo assim, ‘Habemos Papa’ convence. Tem piada, é sincero, e Picolli faz um desempenho dramático muito bom. Talvez o último sopro da sua brilhante carreira. E Moretti cria sempre nos seus filmes um ritmo de diálogo muito interessante.

"Mesmo assim, ‘Habemos Papa’ convence. Tem piada, é sincero, e Picolli faz um desempenho dramático muito bom. Talvez o último sopro da sua brilhante carreira. E Moretti cria sempre nos seus filmes um ritmo de diálogo muito interessante."

‘Habemos Papa’ não é polémico, e mesmo face aos actuais desenvolvimentos, não me parece que o Vaticano alguma vez irá levantar alguma objecção ao filme. Parte de um princípio simples, mas cinematograficamente ousado. Trata os mais elevados membros da igreja simplesmente como homens comuns, e a esta premissa Moretti mistura o seu aclamado charme cómico.

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Miguel. Portuense. Nasceu quando era novo e isso só lhe fez bem aos ossos. Agora, com 31 anos, ainda está para as curvas. O primeiro filme que viu no cinema foi A Pequena Sereia, quando tinha 5 anos, o que explica muita coisa. Desde aí, olhou sempre para trás e a história do cinema tornou-se a sua história. Pode ser que um dia consiga fazer disto vida, mas até lá, está aqui para se divertir, e partilhar com o insuspeito leitor aquilo que sente e é, quando vê Cinema.

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