Ano: 2016
Realizador: Mel Gibson
Actores principais: Andrew Garfield, Sam Worthington, Luke Bracey
Duração: 139 min
Crítica: A época dos Óscares do final de 2016 e início de 2017 foi a primeira em muitos anos, por motivos familiares, em que não fui extensamente ao cinema ver os filmes nomeados. De todos os filmes nomeados nesse ano (no qual ‘La La Land’ foi o grande vencedor mas foi ‘Moonlight’ que ganhou Melhor Filme), aquele que mais tive pena de não ir ver ao cinema foi ‘Hacksaw Ridge’. Não pelas críticas que teve ou pelos prémios que recebeu, mas porque sempre fui um fã, e continuo a ser, de Mel Gibson.
Para mim, Mel Gibson foi o melhor actor de comédias de acção da sua geração, mas também provou ser um grande artista cinematográfico, não só quando passou a fazer filmes de teor mais intenso, mas principalmente quando começou a realizar. Não parecem haver dúvidas que ‘Braveheart’ (1995) é um dos melhores filmes da década de 1990 (e é um dos meus filmes preferidos), e ‘Passion of the Christ’ (2004) e ‘Apocalypto’ (2006), independentemente das controvérsias que rodearam um e outro, são visualmente ousados, desafiando as convenções de uma morna e rígida Hollywood. Assim, foi com grande pena que assisti, a partir de 2006, ao fechar de portas a este grande artista quando, no meio de outras histórias de abuso doméstico e várias declarações infelizes, foi divulgada na internet uma gravação de um Gibson bêbado a dizer ao polícia que o parou na estrada que a culpa das guerras do mundo era dos judeus.
Obviamente que não considero correcta esta atitude de Gibson, mas como cidadão do mundo compreendo que as pessoas com problemas de alcoolismo e também bipolaridade (como provou mais tarde ser o caso), têm, precisamente, um problema, e merecem uma segunda oportunidade. Para além disso, apesar das várias histórias que circularam sobre Gibson, não estamos a falar de crimes de muito maior gravidade como aqueles que o movimento #MeToo agora denuncia. Recordemos que Robert Downey Jr., por exemplo, até chegou a estar na prisão no início dos anos 2000 quando a sua dependência das drogas atingiu o pico, mas agora é o actor mais popular e mais bem pago de Hollywood. Recordemos que as gravações dos insultos de Christian Bale a um técnico no plateau foram rapidamente esquecidas pelo público. Drogas e insultos anónimos Hollywood parece tolerar e perdoar, mas xenofobia não. Assim sendo, foram precisos muitos anos – e inúmeras desculpas públicas e meas culpas depois – para Gibson conseguir voltar a cair nas boas graças dos estúdios e do público mundial.
"Por um lado é um relativamente satisfatório, embora não transcendente, filme de guerra, que sabe carregar nos botões certos para manter o espectador interessado. Por outro, tem muitos dos (maus) tiques que associamos a estas histórias inspiracionais, o que lhe tira credibilidade e intensidade dramática"
Não sabemos se Gibson se arrependeu verdadeiramente das suas palavras, ou se apenas o fez publicamente para poder regressar. Queremos acreditar que a primeira hipótese é a verdadeira, especialmente tendo em conta a sua qualidade como artista cinematográfico. Pessoalmente, acho que se deve fechar a porta a famosos que cometeram crimes graves (afinal são criminosos), embora não possamos, nem devamos apagar o seu legado. Por exemplo, não ponho em questão nunca mais voltar a ver ‘The Ususal Suspects’ só porque Kevin Spacey provou ser um filho da… Claro que o verei porque é um grande filme. Mas não me importarei nada se ele não voltar a fazer outro filme. Contudo, sempre achei o caso de Gibson, e de outros como ele, diferente. E portanto sempre aguardei pelo momento em que pudesse reconhecer o que fez de errado, pelo momento do seu perdão e pelo momento do seu regresso. É só ver o seu filme de regresso como actor, o fantástico ‘Edge of Darkness’ (2010) para percebermos que seis anos foi demasiado tempo para estarmos sem Mel Gibson. Mesmo assim, justamente, a sua integração tem sido lenta, em filmes de acção externos aos grandes estúdios, como ‘Get the Gringo’ (2012), ‘Machete Kills’ (2013), ‘The Expendables 3’ (2014) ou ‘Blood Father’ (2016) onde está mais a cumprir um estereótipo do que verdadeiramente a inovar. Mas faltava ainda mais uma coisa. Faltava o regresso do Gibson realizador. E isso finalmente se deu em 2016, dez anos depois de ‘Apocalypto’.
Quando ‘Hacksaw Ridge’ começou a ser promovido, apercebi-me que o nome de Gibson, provavelmente por causa desta longa polémica, não estava a ser mencionado em lado nenhum. No trailer e no poster lia-se “Do galardoado realizador de ‘Braveheart’”, mas não o seu nome explicitamente. Ao mesmo tempo, o filme teve um orçamento bastante baixo para o que é norma num grande épico bélico (apenas 40 milhões) e foi principalmente produzido e filmado na Austrália natal de Gibson. Ou seja, não era inteiramente claro se Gibson estava ou não a ceder às convenções do ‘filme comercial’, que as seis nomeações que eventualmente recebeu para os Óscares (ganhou duas estatuetas: montagem e som) pareciam fazer querer que sim. E, como não vi o filme na altura, foi uma dúvida que mantive durante dois anos. Era ‘Hacksaw Ridge’ mais um filme ousado de um realizador com um estilo visual bem vincado; ou era apenas mais um dos “filmes inspiracionais, baseados em factos verídicos” que todos os anos inundam os Óscares com a sua superficialidade banal? Pois bem, agora que vi finalmente ‘Hacksaw Ridge’, considero que a resposta a esta pergunta não é ainda clara, porque o filme articula os dois estados. Por um lado é um relativamente satisfatório, embora não transcendente, filme de guerra, que sabe carregar nos botões certos para manter o espectador interessado. Por outro, tem muitos dos (maus) tiques que associamos a estas histórias inspiracionais, o que lhe tira credibilidade e intensidade dramática.
‘Hacksaw Ridge’ conta a história de Desmond Doss (Andrew Garfield) que, ao contrário do que o filme afirma, nem foi o primeiro nem o último objector de consciência a servir no exército americano, embora tenha sido certamente o mais heróico e o mais galardoado. Após uma sequência que nos mostra o inferno da guerra em câmara lenta, vemos alguns quadros representativos da sua infância. Estes quadros não estão particularmente bem trabalhados em termos emocionais (que épico moderno os trabalha?) mas servem para estabelecer um conjunto de pontos que darão jeito mais à frente. O primeiro é que Doss é atlético e corajoso. Claro, se fosse apenas um nerd plácido e religiosamente devoto, seria muito mais difícil para o público aceitar os seus futuros actos de heroísmo. Assim, quer seja verdade ou não, o filme estabelece que ele pode ser todas essas coisas num único pacote de (quase) perfeição. O “quase” está no facto de em criança ter tido uma veia violenta. Numa natural escaramuça, fere gravemente o irmão, o que o tornará, por entre os remorsos, muito mais consciente das consequências da violência. Isso ajuda a justificar a sua escolha de mais tarde se recusar a usar armas.
"Garfield tem um charme desarmante como o campónio simplório; uma espécie de Forest Gump mas com uma verdadeira inteligência que por qualquer motivo esconde em prol desse charme. Contudo, o seu romance [com Dorothy] parece bastante incredível (...) Este é um daqueles filmes em que as personagens secundárias têm propósitos claros: dizer “frases trailer” ao herói para justificar as suas acções, antes de desaparecerem sem deixar rasto."
Igualmente, o filme apoia essa justificação no facto do seu pai, um traumatizado veterano da Primeira Grande Guerra que há muito cedeu ao vício da bebida (Hugo Weaving), recorrer de vez em quando à violência contra a sua família. Isso não impede contudo que seja esta personagem, em pouco naturais momentos de lucidez (apesar da qualidade da interpretação de Weaving) a oferecer alguns discursos emotivos e introspectivos sobre os horrores da guerra, particularmente quando a Segunda Guerra Mundial se inicia e os jovens da cidade, incluindo Desmond e o seu irmão, correm para se alistar. Este é um daqueles filmes em que as personagens secundárias têm propósitos mais do que claros: dizer “frases trailer” ao herói para justificar as suas acções, antes de desaparecerem sem deixar rasto.
Do mesmo modo, o filme perde algum tempo a contextualizar o romance entre Desmond, agora adulto, e a enfermeira Dorothy (Teresa Palmer, talvez no melhor papel da sua jovem carreira). É verdade que Andrew Garfield tem um charme desarmante como o campónio simplório; uma espécie de Forest Gump mas com uma verdadeira inteligência que por qualquer motivo esconde em prol desse charme. Contudo, o seu romance parece bastante incredível. Em circunstâncias normais Dorothy acharia bastante estranho e incomodativo este rapaz “persegui-la” e olhar para ela de forma tão intensa. Se ele fosse feio seria simplesmente creepy. Mas como é o Andrew Garfield o filme pretende que houve ali algum tipo de química que nunca é bem sentido. Pior ainda, apesar destas cenas servirem para humanizar Desmond, justificar as suas razões e provar mais uma vez a sua espectacularidade como ser humano, a verdade é que este enquadramento não tem consequência. Dorothy é mais uma personagem, tal como o pai, que não voltamos a ver (nem mesmo no final do filme), uma vez Desmond obtém o que quer, ir para a Guerra.
Entretanto, Desmond recebeu o seu treino militar em típicas cenas em que ficamos a conhecer os soldados da sua companhia (cada um com a sua “alcunha” e servindo um estereótipo), o seu capitão Glover (Sam Worthington) e o seu sargento (uma surpreendente interpretação de Vince Vaughn, que claramente adora estar a berrar ordens aos seus inferiores). O problema é que Desmond, apesar de querer servir, recusa-se a empunhar uma arma, nem mesmo para treinar. Assim, a primeira metade do filme aborda extensamente a forma como é maltratado e excluído, e as pressões que sofre para desistir do exército. Mas com uma força de vontade inaudita (e extremamente conveniente, do ponto de vista cinematográfico) Desmond persiste. E mesmo perante o tribunal militar manterá a sua convicção, que acaba por a aceitar.
"Hacksaw Ridge’ é gerido com a segurança de um grande realizador, que o monta com coerência e dinamismo (...) Contudo, há uma desapontante simplicidade neste, chamemos-lhe, conto de fadas bélico. (...) A história que lhe dá origem pode ser contada de uma forma tão simples e linear (...), que o filme tem manifesta dificuldade em criar uma história fílmica interessante, personagens que transcendam a tela, e um enquadramento bélico intenso e credível.""
Assim, na segunda metade, Desmond ruma mesmo à guerra e quer o destino que vá parar precisamente a um dos cenários mais sangrentos do final do conflito no Pacífico: a Batalha de Okinawa. Este contexto nunca é explicado e talvez deveria, visto que tudo o que o filme nos mostra é o planalto de Hacksaw. Os soldados americanos têm de subir uma gigantesca escarpa por uma corda e lá em cima, obviamente, são carne de p’ra canhão dos japoneses. Porque é que os japoneses nunca cortaram a corda e deixam os americanos subir uma e outra vez nunca é explicado. Porque é que os americanos têm de subir sempre por ali também não (não havia outro caminho)? Sem justificações (que provavelmente havia) o que o filme mostra parece uma gigantesca e incredível parvoíce militar (dos dois lados), que mais uma vez funciona contra o filme como obra de ficção.
Mas corda acima vão Desmond e o seu pelotão, para uma vibrante, mas estranhamento pouco intensa e sangrenta cena de guerra, que mesmo assim constitui, obviamente, a melhor parte do filme. No meio do inferno, e enquanto seguimos pequenas tramas dos vários soldados na sua luta pela sobrevivência (por vezes perdemos o rasto de Desmond por alguns minutos), este irá mais do que cumprir o seu papel. O filme não o mostra a hesitar, nem a temer, nem a vacilar. É um herói fílmico, mais do que um herói humano (esse que supostamente estaria a ser homenageado). Um médico sempre presente, faz escolhas que salvam vidas. Mais tarde, quando por via das circunstâncias fica no topo da escarpa quando a companhia bate em retirada, conceberá o feito heróico que o levaria a ser condecorado e relembrado para a posteridade. Começa a procurar os feridos abandonados, e por meio de cordas e ao coberto da noite, começa a baixá-los, um a um, para a segurança. O filme faz querer que é esse acto heróico que inspira as tropas a fazerem na manhã seguinte mais um grande assalto, para tomarem definitivamente Hacksaw, e mudarem o curso da Guerra…
No global, ‘Hacksaw Ridge’ é um filme que é gerido com a segurança de um grande realizador, que o monta com coerência e dinamismo suficiente para manter o espectador atento durante as suas duas horas de duração. Contudo, ao mesmo tempo, percebe-se perfeitamente porque é que este foi o filme que permitiu o regresso de Gibson à ribalta de Hollywood. Longe da pura ousadia visual de ‘Braveheart’ ou da intensidade emocional de outros filmes de guerra onde o próprio Gibson havia entrado como actor (particularmente ‘Gallipoli’, 1981, e o mais esquecido ‘We Were Soldiers’, 2002), há uma desapontante simplicidade neste, chamemos-lhe, conto de fadas bélico. Embora haja intensas cenas de guerra, o filme não é bem, bem, um filme de guerra. A história que lhe dá origem é real (isso é indiscutível), mas é tão invulgar, digamos assim, e pode ser contada de uma forma tão simples e linear (é o primeiro dia “de guerra” de Desmond e pronto), que o filme tem manifesta dificuldade em criar realmente uma história fílmica interessante, personagens que transcendam a tela, e um enquadramento bélico intenso e credível.
"As circunstâncias argumentais não permitem que o filme seja muito mais do que um documentário sobre o lendário soldado Doss (...) A sua contextualização emocional nunca é tão cativante quanto deveria ser (...) as outras personagens não têm uma existência individual (...) e há um estranho vazio no final do filme, porque não fecha, ou pelo menos não completa, o arco da personagem. É como se esta tivesse deixado de existir após o dia fatídico em que se tornou um herói. Isso, obviamente, é um contrassenso"
Ou seja, por mais talento que Gibson tenha como realizador (e aqui prova-o que ainda o tem), as circunstâncias argumentais não permitem que o filme seja muito mais do que um documentário sobre o lendário soldado Doss. Aliás, na sequência final ouvimos os verdadeiros heróis (incluindo o verdadeiro Doss) a prestar testemunhos directamente para a câmara de uma forma que nos fascina tanto (ou mais) do que aquilo que o filme nos havia mostrado nas duas horas anteriores. Precisamente por isso, porque é pouco mais que uma reconstituição, há uma enorme artificialidade na trama que o filme nunca consegue sacudir, e várias incongruências gritantes, como aquelas que já mencionei em cima, entre outras, como por exemplo nenhum soldado se lembrar de subir ao planalto para ajudar quando vê, ao longo de uma noite inteira, quase cem soldados feridos a serem baixados, um a um, por uma corda. A realidade por vezes é mais estranha que a ficção, e porque o filme aborda cegamente o percurso de Doss, apenas focado em alimentar a sua lenda, não parece notar na estranheza de inúmeros pormenores que, fosse o filme totalmente fictício, certamente os argumentistas limariam antes das filmagens.
Tudo isso concorre para que este ‘Hacksaw Ridge’, que devia ser uma grande celebração do heroísmo americano, seja um filme algo desapontante. Na superfície, mais do que cumpre o seu papel, visto que está bem fotografado, possui boas actuações, tem uma maravilhosa palete sonora (um Óscar há muito devido para Kevin O'Connell na sua 21a nomeação) e até tem interessantes sequências bélicas, muito embora, verdade seja dita, após ‘Saving Private Ryan’ e ‘The Thin Red Line’ tudo passou a parecer frouxo em comparação no cinema americano. Contudo, o filme tem uma poderosa afinidade ao padrão do “filme inspiracional”, padrão esse que continuamente se impõe para dominar as cenas. E este Gibson deixa-o placidamente. Duvido que o antigo Gibson o deixaria. Este é sem dúvida o seu pior filme dos cinco que já realizou.
A contextualização emocional de Desmond nunca é tão cativante quanto deveria ser (sendo ele um herói); é tão imaculada, a sua personalidade é tão simples e terra-a-terra, e a sua atitude perante os horrores da guerra é tão plácida que praticamente deixa de ser humana. Ao mesmo tempo, as outras personagens não têm uma existência individual; existem apenas para alimentar o heroísmo de Desmond. E por fim, há um estranho vazio no final do filme, porque o filme não fecha, ou pelo menos não completa, o arco da personagem. É como se esta tivesse deixado de existir após o dia fatídico em que se tornou um herói. É como se a sua existência só tivesse sentido até àquele dia. Isso, obviamente, é um contrassenso, porque o objectivo de uma lenda de heroísmo é precisamente que se perpetue, que inspire outras gerações. Como este filme está feito, há uma enorme dificuldade em que isso possa acontecer.
"Na superfície, mais do que cumpre o seu papel, visto que está bem fotografado, possui boas actuações, tem uma maravilhosa palete sonora e até tem interessantes sequências bélicas (...) Mas preso aos factos e menos à emoção, nunca consegue ter o grau de intimidade para tocar emocionalmente (...) E não conseguindo isso (...), nunca consegue ser tão excitante ou cativante ou até inspirador quanto supostamente deveria ser. É o paradoxo de ‘Hacksaw Ridge’.
‘Sully’, de Clint Eastwood, do mesmo ano, é um filme com propósitos semelhantes e uma estrutura fílmica análoga. Mas aí sentimos a glória do feito, acreditamos nele, sentimos o seu peso cena após cena, e por causa disso sentimo-nos inspirados. ‘Hacksaw Ridge’ até pode ter a maior parte dos elementos para ser um dos mais interessantes filmes de guerra “comerciais” dos últimos anos, mas possui essa falha suprema. Não consegue tornar cinematicamente credível esta história invulgar. O filme inspira por definição, porque a maior parte dos espectadores ficou a conhecer esta história pela primeira vez, e é uma história realmente tocante. Mas a verdade é que esse poder é externo ao filme. Já existia na lenda de Desmond. O filme em si não consegue reproduzi-lo com sucesso, através da forma como escolhe recriar o feito cinematograficamente. Fosse esta uma história fictícia, o filme seria desconsiderado como mero sentimentalismo heróico, com pouca profundidade.
Muitos críticos actuais criticam os filmes clássicos baseados em histórias verídicas por tomarem demasiadas liberdades argumentais. É verdade que podiam “inventar” a maior parte dos eventos, mas não mexiam um milímetro na essência das personagens que estavam a retratar, ao mesmo tempo que se construíam com classe e qualidade cinematográfica. Hoje em dia, há muita necessidade de abrir os filmes com as letras “baseado em factos verídicos”, mas os produtores esquecem-se que isso não é suficiente para criar uma obra de cinema duradoira. Para fazer um bom filme é preciso muito mais. E este ‘Hacksaw Ridge’ não o tem. Preso aos factos e menos à emoção, nunca consegue ter o grau de intimidade para tocar emocionalmente, ao contrário de muitos filmes baseados em histórias fictícias. E não conseguindo isso, e visto que a personagem principal não consegue encher a tela (não é um problema da actuação de Garfield, é um defeito da personagem), nunca consegue ser tão excitante ou cativante ou até inspirador quanto supostamente deveria ser. É o paradoxo de ‘Hacksaw Ridge’.
Neste momento, de regresso aos grandes palcos, Mel Gibson está associado à realização de dois filmes: a sequela de ‘Passion of the Christ’ (é mesmo verdade!) e o remake de ‘The Wild Bunch’. Num ou noutro estará certamente muito mais à vontade para mostrar todos os seus talentos como realizador e terá certamente mais liberdade criativa, fora das amarras do comercialismo. Ou pelo menos assim o esperamos. Podemos considerar ‘Hacksaw Ridge’ como um ponto de paragem obrigatório para um realizador que precisava de voltar a encontrar o seu norte e o seu público. Mas ficaremos muito mais interessados para ver o que fará a seguir. Ou pelo menos eu ficarei.
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