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"Cheek to Cheek" no cinema


"Heaven, I'm in Heaven, and my heart beats so that I can hardly speak, and I seem to find the happiness I seek, when we're out together dancing cheek to cheek".

Assim começa a divinal canção "Cheek to Cheek" composta por Irving Berlin em 1935. A canção foi composta propositadamente para o filme 'Top Hat', a mais conhecida de todas as parcerias musicais entre Fred Astaire e Ginger Rogers. O momento alto da película, a canção é a declaração de amor de Fred, e embala o par para um fantástico número de dança, que ajuda a consumar o seu entendimento romântico. Apesar de até ter perdido o Óscar de Melhor Música desse ano para a mais esquecida "Lullaby of Broadway" do filme 'Gold Diggers of 1935' a canção - a mais bem sucedida de 1935 - tornou-se um dos grandes standards da história da música, tendo sido interpretada por ilustres como Bing Crosby, Louis Armstrong, Ella Fitzgerald, Shirley Jones, Frank Sinatra ou mais recentemente Tony Bennett e Lady Gaga (num álbum precisamente intitulado "Cheek to Cheek") ou Andrea Bocelli. Contudo, a versão de Astaire é ainda hoje a mais universal, tendo sido incluída no Grammy Hall of Fame em 2000.

Assim, muito naturalmente, na sua forma original ou através de várias covers, a canção foi reaparecendo de forma regular na sétima arte. O imdb lista mais de cem obras do cinema e da televisão em que a canção foi utilizada na banda sonora. Inspirado por recentemente ter voltado a assistir a 'The Boss Baby' (2017), onde a música é utilizada de forma soberba no genérico de abertura, recordo um conjunto de ocasiões onde "Cheek to Cheek" foi homenageada ou utilizada para enriquecer emocionalmente cenas com múltiplos significados, em grandes obras da sétima arte que esta extraordinária canção torna ainda melhores. É a forma do cinema procurar a felicidade que procura, e do espectador fazer o mesmo.


Top Hat (1935)

Palavras para quê. O original é sempre o melhor. Divinal. Ou melhor dizendo, celestial.



The Purple Rose of Cairo (1985)

Woody Allen nunca escondeu a sua paixão pelo cinema clássico e esse amor sempre esteve presente nos seus filmes. Mas no delicioso melodrama de época 'The Purple Rose of Cairo', onde realidade e cinema confluem, esse amor é materializado sem rodeios, sem subtileza; está patente em todas as cenas, e o filme não se acanha nem tem vergonha em perder largos minutos com a reprodução de cenas de películas clássicas, algo que hoje seria praticamente impensável. Para a personagem de Mia Farrow estes filmes são a sua única forma de escapar à realidade e encontrar a felicidade. A cena em que assiste ao original "Cheek to Cheek" é ainda mais intensa e impactante porque é o seu poder, o poder de 'Top Hat', o poder de Fred & Ginger, que cinquenta anos depois ainda domina. Farrow não precisa de dizer uma palavra. Só precisa de assistir, E por o fazer, mesmerizada e comovida, entendemos os seus sentimentos, porque nós, espectadores de ambos os filmes, conseguimos sentir o mesmo.



The English Patient (1996)

O grande vencedor dos Óscares de 1996, com 9 estatuetas arrecadadas, é um grande épico melodramático "à antiga", pelo que as referências clássicas abundam. O gramofone é uma importante parte da trama, representado o poder da música em várias dimensões. Quando o final da guerra é anunciado, a festa subsequente de aclamação da liberdade - simbolizada por uma dança à chuva - é acompanhada da versão smooth jazz de "Cheek to Cheek" interpretada por Ella Fitzgerald. Felicidade e momentos íntimos cheek to cheek. Que outra música, realmente, os poderia acompanhar?



The Green Mile (1999)

A cena em que a personagem de Michael Clark Duncan'Top Hat' em 'The Green Mile' funciona de certa forma como a cena em 'The Purple Rose of Cairo'. Mas a emotividade é diametralmente oposta. A personagem de Mia Farrow está habituada a ver filmes como uma escapatória à sua vida deprimente. Para a personagem de Duncan, um prisioneiro prestes a ser executado, a satisfação deste desejo é a primeira, e última vez na sua vida que verá um filme. Fica mesmerizado e comovido de igual forma, nas o pormenor importante é que, visto que não repetirá a experiência, para ele a emoção que sente a ver 'Top Hat' e a beleza de "Cheek to Cheek" simbolizam a emoção de toda a humanidade perante a beleza da sétima arte, bem como o poder libertador e esperançoso desta, mesmo perante a morte. Não há palavras para descrevê-lo. Só o visionamento de grandes filmes e o momento de intimidade entre espectador e tela o pode fazer.



Love's Labour's Lost (2000)

A última obra shakespeariana de Kenneth Branagh a ser lançada no grande ecrã até hoje constitui uma experiência ousada, talvez injustamente desconsiderada quer por críticos quer pelo público. A acção relocaliza-se para a década de 1930 e Branagh entrecruza os diálogos do bardo com os grandes standards musicais da época. Paradoxalmente, para quem ama uma e outra coisa, até é uma experiência que resulta, embora se entenda o fiasco generalizado desta obra. "Cheek to Cheek" não podia faltar a este repertório. Esqueça, caro leitor, os diálogos em espanhol (não encontrei outro vídeo no youtube) e salte para os 2'30'' onde Branagh inicia (sem dobragem) a canção. Talvez os actores não sejam os melhores cantores nem dançarinos do mundo, talvez os números musicais sejam singelos e talvez a sua inclusão seja algo forçada. Mas Branagh concebe, de forma temerária, momentos únicos na história do cinema shakespeariano. E isso tem o seu mérito.



The Boss Baby (2017)

'The Boss Baby', um dos mais recentes filmes de animação da Dreamworks, é uma bem conseguida alegoria sobre o crescimento e a aceitação de um irmão mais novo, tal como já descrevi na minha crítica. O fabuloso genérico de abertura (a melhor cena do filme) leva-nos à "fábrica" onde os bebés são produzidos, e assistimos ao processo que leva à sua criação (para as famílias ou para a gerência) ao som da voz de Fred Astaire que se ajusta como uma luva com a sua cristalina simpatia. Este vídeo do youtube tem alguns cortes  (provavelmente por motivos de copyright) mas já dá para ficar com uma ideia. Nas míticas palavras de Richard Attenborough em 'A Matter of Life and Death' (1946): "Heaven, isn't it?"

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Miguel. Portuense. Nasceu quando era novo e isso só lhe fez bem aos ossos. Agora, com 31 anos, ainda está para as curvas. O primeiro filme que viu no cinema foi A Pequena Sereia, quando tinha 5 anos, o que explica muita coisa. Desde aí, olhou sempre para trás e a história do cinema tornou-se a sua história. Pode ser que um dia consiga fazer disto vida, mas até lá, está aqui para se divertir, e partilhar com o insuspeito leitor aquilo que sente e é, quando vê Cinema.

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