Realizador: Pierre Coffin, Chris Renaud
Actores principais (voz): Steve Carell, Kristen Wiig, Benjamin Bratt
Duração: 98 min
Crítica: Em 2010 uma nova companhia de animação por computador apareceu: a Illumination Entertainment, com um contrato de distribuição exclusiva com a Universal. Aliás, a Universal era das poucas companhias que não debitava ainda filmes de animação nesta nova moda pós-2000. Após ter aberto com o muito original e engraçado ‘Despicable Me’ (2010), a Illumination trilhou caminho com ‘Hop’ (2011) e com o magnífico ‘The Lorax’ (2012). Não considerando ‘Hop’ (que mistura imagem real com a animação), os dois primeiros filmes da Illumination mostraram uma capacidade criativa e uma qualidade de produção que já não se via desde o início da Pixar. Não só isso, mas quer ‘Despicable Me’, quer ‘The Lorax’ são dois dos melhores filmes a utilizar a tecnologia 3D. Por estas razões, e numa altura em que a Pixar decresce de qualidade, e a Dreamworks está a ir pelo mesmo caminho, mais de rotina e menos de criação (a Dreamworks já está em um filme a sair cada seis meses…), muitas esperanças passei a ter nas novas obras da Illumination.
‘Despicable Me 2’ é o mais recente trabalho da companhia que chega agora às salas de cinema portuguesas. Nesta época de produção massiva e falta de criatividade, e após o sucesso do filme original, que marcou a imagem da Illumination (o seu símbolo está agora associado aos Minions, as deliciosas criaturas amarelas de Despicable Me), a sequela era mais que inevitável. E se ainda existe muita criatividade e qualidade no trabalho da Illumination, é certo, a verdade é que ‘Despicable Me 2’ sofre da clássica síndrome das sequelas.
Para começar há um ênfase desmesurado na capacidade cómica dos Minions. O primeiro filme era rico em pequenos pormenores de comédia, precisamente porque eram à partes, mas à partes que não eram descontextualizados da história principal. A aparição da mãe de Gru (voz de Julie Andrews), e dos pequenos bicharocos amarelos (uma das criações mais originais da animação das últimas décadas), por exemplo, constituíram momentos deliciosos no primeiro filme. Na sequela a mãe é inexistente (na clássica tentativa de eliminar personagens secundárias para se centrar naquelas que o estúdio acha que o público quer ver), e os Minions têm demasiado tempo de antena. 99% das vezes são extremamente engraçados, mas a meu ver o enfoque neles é exagerado, acabando por consumir muito tempo do filme. Não é uma questão de o público se fartar, é uma questão de desequilíbrio. A sua comédia funcionava precisamente porque era um à parte. Quando o à parte se torna o todo por vezes é estranho. Pior, não houve muito segredo nas sequências com os Minions. Tirando um ponto que é importante para a história e que eu não vou revelar, todas as sequências dos ‘Minions a serem Minions’ já tinham sido vistas pelo público que (como eu) seguiu os ‘teaser trailers’ e os ‘clips promocionais’ deste filme ao longo do último ano. Sinceramente, não me lembro de ter visto no cinema uma sequência que já não tivesse visto, totalmente ou parcialmente, em casa. A somar a isto tudo, foi anunciado que o próximo filme da Illumination será ‘Minions’, um spin-off com estas personagens. É como digo. Parece-me que estão a sugar a galinha dos ovos de ouro demasiado depressa. Se agora ainda lhes acho graça (muita graça diga-se), para o ano já tenho a distinta sensação que vou começar a fartar-me…
As meninas que Gru tinha adoptado no primeiro filme estão agora muito mais unidimensionais. Isto é talvez consequência da falta de tempo depois do filme tratar os Minions, Gru, o seu interesse amoroso (outro cliché clássico de sequelas), e o vilão. E não sei se alguém notou, mas só a filha mais nova e a mais velha têm frases. A mais velha começa a interessar-se por rapazes, a mais nova anseia por uma mãe. A filha do meio tem pouco mais que duas frases no filme. Já não há a profundidade da relação pai-filhas que tão magnificamente tinha sido explorada no primeiro filme. Há um cliché das crianças em crescimento e de um pai a tentar controlá-las, segurá-las, entendê-las e amá-las ao mesmo tempo. Tudo superficial, nada de profundo.
O mesmo se passa com o vilão. Se analisarmos bem o filme, o vilão não tem um plano por aí além. Há um grande mistério sobre quem é o vilão, há varias possibilidades e até quase ao final do filme não sabemos quem é (ou melhor o filme não sabe quem é, porque o espectador adivinha). Mas o seu plano é muito mixuruca. É mais uma desculpa para as acções das outras personagens do que propriamente uma parte da história. Há muito ênfase na construção e pouco no conteúdo.
Basicamente, Gru está retirado da sua vida de vilão e tenta agora ganhar a vida como produtor de geleias (feitas por quem mais… os Minions). Ao mesmo tempo, continua empenhado no seu papel de pai, o que origina uma engraçada sequência no início, ao tentar agradar à filha mais nova. Quando um novo vilão rouba uma fórmula secreta, Gru é recrutado pela liga anti-vilões (chefe Silas Ramsbottom… bottom!) para salvar o dia. É acompanhado por uma nova agente (voz de Kristen Wiig), cheia de genica mas ainda pouco eficiente, que acaba por ser o seu interesse amoroso e a potencial nova mãe das crianças. Para detectarem o vilão, ambos infiltram-se como comerciantes num centro comercial pois um dos lojistas será o criminoso. Ao mesmo tempo, as filhas anseiam que o seu pai adoptivo encontre a sua cara metade...
Como disse, o argumento vilão/mistério está pouco desenvolvido. Existe muita construção, muito envolvimento das personagens, mas o sumo após espremer é pouco. Isto é bom no sentido em que as relações entre as personagens podem ser mais bem exploradas, mas na verdade isto não acontece plenamente. Há muitos momentos engraçados, dos Minions e não só, mas o facto é que os mais engraçados de todo o filme foram já vistos nos trailers. No geral é um filme que flui bem, é visualmente apelativo e é bom entretenimento. Mas já é claramente um passo abaixo de ‘Despicable Me’ e de ‘The Lorax’. Embora tenha visto o filme em 2D, nota-se claramente que a perspectiva está muito bem trabalhada, pelo que o 3D será, sem dúvida alguma, mais uma vez brilhante. Inclusive há de novo uma sequência nos créditos somente para brincar com a perspectiva 3D, algo que foi um dos marcos do primeiro filme.
No final não consegui muito bem decidir se tinha gostado ou não de ‘Despicable Me 2’. Não é tão bom como os restantes filme da Illumination, mas isso poderá ser consequência de ser uma sequela, e por isso estar truncado pelas clássicas regras (muitas vezes pouco correctas) das sequelas e da potencialidade de rendimento que os estúdios associam a elas. Por outro lado, é ainda uma animação fresca e original, talvez consequência dos poucos anos de vida do estúdio. E para os fãs dos Minions ‘Despicable Me 2’ roçará o divinal. A sequência final, onde cantam ‘I Swear’ e ‘YMCA’ na sua maneira particular, é absolutamente brutal. Mas, como disse, lamento um pouco o facto dos Minions terem roubado o filme a todas as outras personagens, incluindo a Gru. Tal como nos filmes de ‘Ice Age’, em que Scrat foi ganhando tempo de antena, aqui também os Minions vão consumindo sequência atrás de sequência. Mas enquanto Scrat foi ganhando cenas de uma forma controlada e que não afecta o equilíbrio da história base, (e já vai no quarto filme!), os Minions (só no segundo) ficaram completamente fora de controlo em termos de peso na história. Claro que a tentação é grande de exibir este potencial cómico (que é ainda realmente cómico), mas creio que isso afectou claramente a profundidade de todas as outras personagens e a construção da história. Ou seja, a inserção de mais e mais momentos de comédia afectou a qualidade do filme. Parece um paradoxo, eu sei, mas foi o que senti. Sendo 'Despicable Me' o grande filão comercial da Illumination, já adivinho sequelas por aí fora, quer de Gru, quer dos Minions, o que em perspectiva não me soa nada bem...
‘Despicable Me 2’ é entretenimento do bom, do melhor que se faz hoje em dia. Mas já não lhe posso chamar um grande filme de animação.
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