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Sherlock Holmes and the Voice of Terror

Ano: 1942

Realizador: John Rawlins

Actores principais: Basil Rathbone, Nigel Bruce, Evelyn Ankers

Duração: 65 min

Crítica: (Nota: Esta é a primeira de três críticas sobre os filmes de Sherlock Holmes realizados durante a década de 1940. Pode ler a introdução a este ciclo na crónica ‘Basil Rathbone é Sherlock Holmes!’ que publiquei há uns dias.)

Como descrevi na crónica ‘Basil Rathbone é Sherlock Holmes!’, após dois filmes na 20th Century Fox (ambos de 1939), a franchise de Sherlock Holmes foi cancelada. Contudo, três anos depois, a Universal retomou a saga e ‘Sherlock Holmes and the Voice of Terror’ (em português ‘Sherlock Holmes e a Voz do Terror’) tornou-se o primeiro dos doze filmes que viriam a ser feitos neste estúdio até 1946. É também o primeiro filme a abandonar a Londres Vitoriana e a transladar Sherlock Holmes para o nosso tempo, numa Inglaterra em plena Guerra Mundial sob a constante ameaça Nazi. A abrir, o filme anuncia precisamente isso, com um intertítulo que afirma que “Sherlock Holmes, a imortal personagem de ficção criada por Sir Arthur Conan Doyle é intemporal, invencível e imutável. Ao resolver problemas significativos dos dias de hoje permanece – como sempre, o mestre supremo do raciocínio dedutivo”. 

Contudo, apesar desta manobra ousada e deste promissor intertítulo, o filme, o único realizado por John Rawlins – um especialista de policiais de série B (todos os restantes onze filmes teriam Roy William Neill atrás da câmara), é de certa forma uma decepção. Ostensivamente, o filme baseia-se no conto de Conan Doyle ‘His Last Bow’, passado nas vésperas das Primeira Grande Guerra, mas daí pouco tira, com notável excepção do famoso monólogo moralista sobre como a Inglaterra prevalecerá que Holmes declama no conto e que o filme, obviamente, reproduz palavra a palavra no seu final. Mas a restante re-imaginação da história é demasiado simplista, e o argumento tem muito mais de propaganda do que propriamente de excitação dedutiva.

O potencial do genial Basil Rathbone como Holmes, contudo, é inegável, e a sua química com o simpático e algo despassarado Watson (Nigel Bruce) também, não se alterando muito da Fox para a Universal. O que se altera, e muito, é a forma como esse potencial e essa química acabam por ser (ou neste caso, não ser) exploradas em prol da história e do filme. A primeira cena do filme é claramente a melhor em todos os sentidos, quando Holmes, convocado de emergência para uma reunião secreta do governo inglês, usa as suas brilhantes capacidades dedutivas para descobrir coisas sobre os vários membros do Comité. Aqui, no único local do filme em que faz deduções dignas de Holmes (muito embora sejam feitas só por “diversão”), temos um vislumbre do quão eficaz podia Rathbone ser como Sherlock, com movimentos minimalistas mas com toda a energia condensada na voz chicoteante, entre o viperino e o assertivo; os mesmos motivos que, moldados para o mal em vez do bem, o haviam tornado um excelente vilão do cinema da década de 1930.

A partir daí, contudo, o filme transforma-se num produto menor, e pobre, de espionagem. As deduções, se é que se as pode chamar assim, são fracas e previsíveis, já que o público consegue fazê-las facilmente à medida que a história se vai desenrolando (muitas vezes até antes de Holmes – um claro turn-off). Estar Holmes a investigar este caso, ou qualquer outro herói da década, quer fosse um agente secreto ou um herói acidental de Hitchcock, pouca diferença faria no resultado final destas cenas.

A história restringe-se à tentativa de identificação do líder da máquina Nazi infiltrada em Inglaterra; a temível Voz do Terror, que todos os dias faz ameaças na rádio que se materializam pouco depois (um incêndio numa fábrica, um bombardeamento, etc). Se inicialmente Holmes ainda faz alguma investigação (embora muita coisa lhe vá, literalmente, ‘parar ao colo’) que o leva ao sub-mundo Londrino (os ambientes fumarentos dos pubs e das ruas não iluminadas, bem como os sotaques cokney, adequam-se maravilhosamente a este produto de série B), cedo o filme insinua, e o espectador percebe, que a Voz do Terror poderá ser precisamente um dos membros do tal Comité que o havia convocado inicialmente e a quem Holmes reporta regularmente durante o filme. O filme divide-se então entre uma espécie de whodunit (qual dos membros é?!) e uma luta contra o tempo para parar uma iminente invasão secreta das costas britânicas…

Como disse, o filme tem muito pouco de suspense e de dedução, mas tem aos magotes frases-feitas moralistas e demonstra, de uma forma trágica e heróica, muito espírito de sacrifício do cidadão comum. A personagem de Kitty (Evelyn Ankers), a namorada de um homem assassinado quando estava prestes a revelar qualquer coisa a Holmes, é o exemplo mais premente. O discurso emotivo que faz no pub, a incitar todos a lutarem contra a ameaça invisível dentro do seu próprio país, é um dos momentos altos do filme que certamente terá comovido as audiências de 1942 e ainda hoje vibra no espectador. Mas o resto do filme não está à altura e, afinal, se isto é um filme de Sherlock Holmes, o espectador esperaria bastante mais.

Com pouco mais de uma hora de duração, ‘Sherlock Holmes and the Voice of Terror’ é um filme de ritmo lento e tensão simplista que mais tarde associaríamos a um show televisivo ou a uma série de espionagem. Mas numa era pré-televisão, e como obra cinematográfica, está a anos-luz de filmes com a mesma temática que por esta altura Hitchcock ou Fritz Lang andavam a fazer. O seu clímax explicativo, numa igreja meia destruída que serve de covil dos Nazis, é algo frouxo (também a história não dava para mais) e constrói-se apenas com o intuito de levar o filme a terminar numa nota elevada, com o seu famoso discurso inspiracional, música heróica a condizer e claro, o apelo no genérico final para os espectadores comprarem títulos de Guerra. 

Resumindo, ‘Sherlock Holmes and the Voice of Terror’ consegue entreter minimamente, mas não foi certamente o começo mais auspicioso da saga no seio da Universal. Precisamente porque não é um filme de Sherlock Holmes. É apenas e só um filme de propaganda (afinal é esse o seu grande objectivo) que, quase por mero acaso, tem Holmes ao barulho. Embora Holmes não surja propriamente fora do seu meio (o dinamismo de Rathbone trata disso), está claramente fora da sua essência e é por isso que este filme fica inevitavelmente datado. A luta contra o mal pode ser eterna e intemporal, mas fora do contexto de Guerra este filme tem muito poucas valências intrínsecas, ao nível do mistério e da sua resolução, que consigam suster o teste do tempo. Felizmente, seria uma falha que a saga iria aprender a colmatar nos filmes seguintes…

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Miguel. Portuense. Nasceu quando era novo e isso só lhe fez bem aos ossos. Agora, com 31 anos, ainda está para as curvas. O primeiro filme que viu no cinema foi A Pequena Sereia, quando tinha 5 anos, o que explica muita coisa. Desde aí, olhou sempre para trás e a história do cinema tornou-se a sua história. Pode ser que um dia consiga fazer disto vida, mas até lá, está aqui para se divertir, e partilhar com o insuspeito leitor aquilo que sente e é, quando vê Cinema.

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