Realizador: Charles Chaplin
Actores principais: Charles Chaplin, Edna Purviance, Charles Aber
Duração: 32 min
Crítica: (Esta é a oitava crítica de um ciclo sobre as 10 curtas-metragens que Charles Chaplin realizou durante o seu período com a distribuidora First National (1918-1923). Pode ler a introdução a este ciclo na minha crónica “Chaplin na First National (1918-1923) - Introdução para um ciclo de críticas” (link aqui), bem como ter acesso aos links para as restantes críticas à medida que forem publicadas.)
Depois de ‘The Kid’, conseguimos sentir o desejo de Chaplin de prosseguir com as suas novas ambições artísticas e dramáticas, a sua nova personalidade do Vagabundo e a sua independência criativa. Mas se o faria a partir de 1923 com os filmes para a “sua” United Artists, não encontramos propriamente isso nas últimas três curtas que Chaplin ainda devia à First National e que fez entre 1921 e 1923. Provavelmente não queria dar o ouro ao bandido, mas isso não implica que estas últimas três curtas sejam menos interessantes, porque Chaplin era um mestre consumado da sua própria personalidade e da sua comédia, portanto, se era isso que era necessário produzir, então produzia-o como ninguém… custasse o que custasse, em termos de tempo, dinheiro e paciência do seu staff!
‘The Idle Class’ é claramente a melhor destas três últimas curtas-metragens de Chaplin, pós ‘The Kid’. Ao contrário do que o título pode deixar antever, em ‘The Idle Class’ Chaplin regressa à comédia pura em detrimento da crítica social, baseando o seu trabalho em gags muito bem construídas, assentes numa história que, não sendo transcendental (ou lírica e pungente como a de ‘The Kid’), é suficientemente interessante para manter a atenção do espectador e a bola a rolar, ou seja, é suficiente para servir de catalisador da comédia.
Curiosamente, tendo em conta a evolução do Vagabundo nos últimos anos (já abordei esta questão na introdução a este ciclo), Chaplin molda-o em ‘The Idle Class’ muito mais próximo dos seus primórdios das curtas da Keystone e da Essanay, talvez para enfatizar a dicotomia entre o pequeno homem e a classe ociosa. Este retorno às origens é imediatamente perceptível na hilariante cena no campo de golfe (Chaplin em principio ter-se-á inspirado na sua própria ideia de ‘How to Make Movies’, já criticado), onde o Vagabundo torna-se um “ladrão de conveniência" (de bolas para poder jogar) e tem atitudes algo manhosas e interesseiras.
Mas seria impossível a Chaplin, supõe-se, fugir da poderosa personalidade e do poderoso significado do Vagabundo que lentamente se revelava e que havia tido o seu expoente máximo em ‘The Kid’. Daí o Vagabundo revelar também o seu lado mais sensível, principalmente num segundo acto passado numa mansão, onde uma grande festa está a decorrer. O Vagabundo entra por necessidade (fugir da polícia, claro está), mas vai tornar-se o centro das atenções, primeiro porque é confundido por Edna pelo seu marido bêbado, dono da casa (Chaplin num dual papel que o permite regressar ao estado ‘bêbado’ que o tornou famoso), e depois na caótica e característica cena de perseguição que constitui o clímax cómico da curta.
‘The Idle Class’ é uma pérola. Primeiro porque é hilariante. Segundo porque mistura um excelente domínio da gag “moderna” de um Chaplin mais maduro com as suas personalidades iniciais quer do Vagabundo inocentemente matreiro, quer do bêbado (e quão engraçado é Chaplin dentro de uma armadura, sem conseguir soltar-se?!). Este contraste estilo Príncipe e o Pobre ou Jekyll e Hyde constitui um híbrido invulgar (depois, recorde-se, de já ter feito 'The Kid'), mas inevitavelmente cómico, que liga o seu passado e o presente numa quase auto-homenagem hilariante aos melhores momentos do seu repertório e do seu estilo cinematográfico.
Inevitavelmente, a curta termina com o Vagabundo a ir (ou a fugir!) para o horizonte sem ganhar (quase) nada; um final clássico mas não artístico nem pungente como seria daí em diante. Mesmo assim, tudo somado ‘The Idle Class’ é sem dúvida alguma a última grande curta-metragem de Chaplin (que só faria mais duas em toda a sua vida). Se quisermos resumi-la podemos dizer “Chaplin joga golfe e depois ‘crasha’ um baile de máscaras”. Mas tem mais, muito mais, do que isso, e aí reside o seu génio, ou quase quase.
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