Realizador: Mel Brooks
Actores principais: Mel Brooks, Lesley Ann Warren, Jeffrey Tambor
Duração: 92 min
Crítica: Extraída de uma crónica sobre a carreira de Mel Brooks que pode ser consultada aqui.
Todos os cómicos anseiam fazer o seu ‘filme sério’ e ser reconhecidos como grandes actores/autores, desde Chaplin (‘A Woman of Paris’ de 1923) a Jim Carrey (‘Truman Show’, ‘The Majestic’). Brooks, claro, não podia ser excepção. Na verdade, Brooks já fizera filmes sérios, e bons, mas apenas os produzira. A sua produtora Brooksfilms fez ‘Elephant Man’ de David Lynch, por exemplo (aliás Brooks é creditado como a pessoa que deu a primeira oportunidade num grande estúdio a Lynch). ‘Life Stinks’ é o que se pode aproximar de ‘filme sério’ com a mão directa de Brooks (realização e actuação). Apenas aproximar porque claro, não é na verdade um drama. É uma comédia, mas é uma comédia assente em pontos dramáticos muito claros, e que chega a ser tão pungente que rapidamente se passa do sorriso às lágrimas.
Brooks é um milionário que só tem olhos para o próximo negócio imobiliário. O filme abre com uma cena na empresa de Brooks, onde ele anseia (muito veementemente!) construir uma série de arranha-céus num local onde agora existe um bairro pobre e degrado. Ele apenas pensa nos milhões e não nas pessoas que vai desalojar. Eis que entra em cena o seu rival, que anseia pelos mesmos quarteirões. Numa disputa de cavalheiros, este engana Brooks com uma aposta. Se Brooks conseguir viver 1 mês, começando sem dinheiro, naquela zona da cidade, então os terrenos serão seus. Brooks aceita, desconhecendo o que é ser pobre e sem abrigo. Muito à semelhança de ‘Sullivan’s Travels’, o filme de Preston Sturges de 1941, Brooks entra num mundo, semi-cómico e por vezes pouco realista, da pobreza e dos sem-abrigo. Aí faz uma série de amigos, donde se destaca Lesley Ann Warren, que tem uma performance magistral. Claro que Brooks vai começar mal e acabar bem. Claro que no fim se vai arrepender e em vez de construir um arranha-céus vai construir um centro social. Claro que o vilão vai tentar que Brooks, sem dinheiro nem identificação, não volte a tomar conta do seu império, e um exército de sem abrigo se irá revoltar no fim do filme.
Mas também, menos claro, há cenas que tocam notas que ninguém esperava de Brooks, mas é o próprio que rapidamente as desfaz, talvez com medo que o filme perca o seu tom leve. Assim ocorrem antíteses. Vemos uma cena extremamente comovente em que um dos sem-abrigo morre de fome e frio numa noite mais dura, mas logo na a seguir, quando Brooks, Warren e mais um sem-abrigo tentam deitar as suas cinzas num esgoto (é o ‘mar’ mais próximo), atiram-nas contra o vento e, obviamente, ficam todos sujos. Brooks nunca deixa o dramático tomar conta. É o filme que fica a perder, na minha opinião. O resultado final nunca é tão cómico, nem nunca é tão dramático, por isso, superficialmente, o filme fica a saber a pouco. Contudo, surpreende-me a forma abrupta como este filme foi descartado e esquecido. Surpreende-me como Lesley Ann Warren não foi nomeada para Óscar de actriz secundária (já foi, mas não neste filme). A cena em que ela e Brooks dançam num armazém de roupa no qual entram para passar a noite é mágica, e recorda os velhos musicais dos anos 1930 com o Fred e a Ginger. ‘Life Stinks’ é o último grande filme de Brooks e, a par de ‘Twelve Chairs’, é um tesouro escondido.
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