Realizador: Ruben Alves
Actores principais: Rita Blanco, Joaquim de Almeida, Roland Giraud
Duração: 90 min
Crítica: O filme mais falado no momento em Portugal, ‘La cage dorée’ (A Gaiola Dourada) é um ligeiro drama de costumes. Não lhe chamo comédia de costumes porque não o é. Não tem suficientes momentos hilariantes ou sequências engraçadas para ser abertamente considerado uma comédia. Também não é um drama complexo, mas sim um estudo social estereotipado que, por ser de costumes, é inevitavelmente cómico por definição, desde que o espectador esteja ciente de quais esses costumes são. Ou seja, optando por tentar dar uma certa profundidade a estas personagens, mas mesmo assim mantendo o lado engraçado do estereótipo, o argumentista-realizador estreante Ruben Alves acaba por ficar no meio termo entre o drama e a comédia. Mesmo assim, para ‘drama ligeiro de costumes’, ‘A Gaiola Dourada’ acaba por ser um filme leve, que flui bem e que se vê ainda melhor, ideal para um público de todas as idades num dia de Verão, sem contudo constituir uma grande obra cinematográfica, nem uma grande obra de referência em termos de retrato engraçado de um povo, como foi, por exemplo, ‘Bienvenue chez les Ch'tis’ (2008), a obra-prima cómica de Dany Boon sobre os povos do norte de França, que se tornou o filme francês mais visto em França de todos os tempos (com mais de 20 milhões espectadores) e o terceiro de sempre, apenas atrás de ‘Avatar’ e 'Titanic'.



Sempre latente está a questão de regressar ‘à terra’, às origens, ou ficar num sítio onde supostamente todos aprenderam a depender deles. Isto mistura-se às questões de identidade dos filhos, e à constante luta contra o estereótipo que os vários franceses (desde colegas de trabalho a colegas de escola do filho) vão tendo. Só quando as várias personagens da família, e em particular Maria e José, aprendem a ultrapassar estes complexos, é que finalmente ficam livres para tomar a decisão que os fará felizes…
‘A Gaiola Dourada’ está a ser aclamado como o filme definitivo sobre o imigrante português em França. Não creio que o seja. Ou melhor, poderá ser por uma única razão, é o único filme sobre o imigrante português em França. De estereótipo em estereótipo, o filme acaba por ter vislumbres de humanidade, e é nessas alturas em que brilha, mais do que ouvir a Maria Vieira a dizer as suas próprias versões do ‘vem ici’ com palavrões portugueses à mistura. Claro que o público se irá rir. Muitas vezes forçará o riso, mas rir-se-á na mesma, e talvez isso seja o mais importante. Por vezes há a identificação, por vezes há a nostalgia, mas essas vezes acabam por ser poucas. Mas para um filme que procura divertir-se com uma coisa séria acaba por não ser tão mal conseguido quanto isso. Não fiquei muito convencido, mas tenho que reconhecer que para trabalho de estreia de um jovem realizador (que tem um pequeno papel no filme como Miguel, o ex-namorado da filha), que experimenta com alguns planos de câmara interessantes, que brinca com estereótipos, e que vai misturando drama e comédia com (alguma) destreza, até acaba por ser um produto interessante. Mas continuo com a sensação que se eu não fosse português, se não conhecesse tão bem a realidade retratada, o filme não despertaria nem interesse, nem piada. E depois atira-se de tudo para o olhar da câmara, desde o fado, à comida, ao Pauleta, ao bacalhau, à obsessão que os estrangeiros têm de que aqui falamos espanhol, etc, etc. O filme acaba por ser um pacote condensado do ‘português visto pelos franceses’, que peca por seguir esses lugares comuns, mas que oferece um entretenimento de qualidade, melhor (reitero, muito melhor) que qualquer comédia romântica, ou filme banal de acção que nos chega de Hollywood. E, melhor que isso, algo que é raro em filmes que envolvam portugueses, as actuações são boas e convincentes (retirando Marias Vieiras e afins). Os luso-descendentes, como Barbara Cabrita, que interpreta a filha mais velha, deveriam ser nomes a reter no panorama nacional. Talvez fosse bom mandar a geração ‘Morangos com Açúcar’ toda para França, para aprender com esta gente.
Talvez ‘A Gaiola Douro’ não faça rir, mas fará certamente sorrir, e a hora e meia de filme passará tranquila e alegremente, até que a imagem final do nosso Portugal nos embale. Tal como Maria, que fantasia por esse momento durante toda a história, o momento em que tem toda a família reunida na ‘santa terrinha’, também o público (português) partilhará essa fantasia, e abraçará, finalmente, o filme. Infelizmente, o público estrangeiro não terá esse prazer.
0 comentários:
Enviar um comentário
Porque todos somos cinema, está na altura de dizer o que vos vai na gana (mas com jeitinho).